A importância da água é tão grande que os antigos a incluíam entre os poucos elementos supostamente existentes, ao lado do ar, da terra e do fogo. Para as condições reinantes na superfície do globo terrestre, a água é a única substância que se apresenta em estado sólido, líquido e gasoso. A chamada água potável, boa para o consumo, é a que contém, por litro, uma solução com 60 a 350 mg de minerais, e de 20 a 45 cm3 de gases do ar. É aconselhável que sua temperatura não seja inferior a 5°C (para não irritar a mucosa gástrica), nem ultrapasse 15°C, quando a água já se torna desagradável ao paladar. Embora abundante, á água do mar não se presta para beber por conter uma grande quantidade de sais dissolvidos (em média, 35 g por litro), com acentuada predominância do cloreto de sódio, o conhecido sal de cozinha, que constitui 78% desse total. Isto significa dizer que um metro cúbico de água do mar evaporada numa salina deixaria um resíduo de 35 kg de sais, dos quais 27 kg seriam de cloreto de sódio.
Dessalinização
Os rins só têm condições de segregar água com teor máximo de 2% de sais. Como a água do mar possui 3,5%, se for ingerida na quantidade de um litro, o organismo terá que eliminar 1,75 litro em forma de urina, mais 0,75 litro às custas da própria desidratação. O desejo do homem de transformar a água do mar em água doce remonta à Antigüidade. Aristóteles, preocupado com o problema, costumava dizer aos alunos que “a água salgada, quando passa a vapor, se torna doce e o vapor não produz água salgada depois que se condensa”. Dentre as grandes instalações dessalinizadoras existentes hoje no mundo, contam-se as do Kuait, Aruba, Bahamas, Curaçao (que eu visitei em 1975) e Gibraltar. Em decorrência do crescimento populacional e das atividades humanas, a escassez de água doce torna-se cada vez mais acentuada, mesmo nas regiões de precipitação pluviométrica normal. Mas qual seria a precipitação pluviométrica “normal”? Através de dados estatísticos, sabemos que a altura média anual de chuva no mundo é da ordem de 500 milímetros. Este valor permite avaliar se numa determinada região chove muito ou pouco. Os lugares mais secos do planeta são sabidamente os desertos como o do Saara, o maior deles. Em Aricas, no Chile, praticamente não chove. Contrariamente, em Cherrapungi, nordeste da Índia, campeã das precipitações pluviométricas, ocorreu em 1936 a maior altura anual de chuva de que se tem notícia, no valor de 25 mil milímetros (25 metros), 50 vezes maior que a média mundial.
Consumo
O consumo doméstico, comercial e público de água nos centros urbanos é superado – e muito – pelo consumo industrial e agrícola. Para se ter uma idéia, são necessários de 150 a 300 m3 de água para se fabricar uma tonelada de aço. No entanto, por questões de economia, faz-se com que essa água circule, diminuindo o desperdício, que passa para a casa dos 10 m3 – um gasto grande, mesmo assim. Assim, enquanto o uso da água doce cresce em grandes proporções, os mananciais de onde ela vem, considerados em conjunto, continuam praticamente invariáveis em volume. Há, inclusive, quem veja a possibilidade do vapor de água presente na atmosfera escapar aos poucos do planeta pela ação da gravidade, diminuindo, assim, a quantidade de água existente na Terra – mas isso não passa de hipótese. Se o nosso planeta fosse uma esfera perfeita, com superfície uniforme, ele seria totalmente coberto por uma camada com 2,7 km de espessura de água. Segundo os pesquisadores, do total de água doce e salubre existente em estado líquido, 98,5% são de difícil aproveitamento, pois estão no subsolo. Apenas 1,5% forma os mananciais de superfície, representados em 99% pelos lagos e 1% pelos cursos d’água.
Reservas do precioso líquido
Mais de 60 países estão situados em zonas áridas, nas quais é crônica a falta de água, o que de certo modo entrava o seu desenvolvimento. No Kuait, um pequeno país do Oriente Médio onde estão localizados alguns dos maiores centros petrolíferos do mundo, toda a população já consome água do mar dessalinizada – evidentemente, de custo elevado. Antigamente, a água era fornecida pelo Iraque, país vizinho, através de barcos e, eventualmente, de avião. O desequilíbrio entre a população mundial e as reservas de água doce cresce com o passar dos anos, e já preocupa vários países, não somente os que seriam as primeiras vítimas, mas principalmente aqueles que se julgam responsáveis pelo destino da humanidade. Leiam um trecho do livro “Água”, de Marq de Villiers, que mostra como este precioso recurso natural poderá acarretar “a mais séria crise do século 21”: “Guerras ou ameaças de guerra têm acontecido em vários sistemas ribeirinhos. As reservas de água das colinas de Golan e Gaza freqüentemente figuram nas intenções militares de Israel e adjacências. Os rios Jordão, Yarmuk e Litani sempre foram objeto de planos militares, e Israel sempre tratou a água como assunto de segurança nacional. A água, e o rio Indo em particular, prejudicou as relações entre a Índia e o Paquistão; Índia e Bangladesh disputam o Ganges por décadas. O Iraque, a Síria e a Turquia mobilizaram as suas tropas em defesa de seus direitos sobre as águas dos rios Tigre e Eufrates. Os EUA se ‘apoderaram’ literalmente do rio Colorado, no México, em sua maior parte para irrigar os desertos do Arizona e da Califórnia, mas também para suprir suas piscinas de Los Angeles e as fontes ornamentais de Las Vegas. O rio Paraná, represado, tem causado atrito entre a Argentina e o Brasil”
Medidas tomadas
A ciência e a indústria já se encontram mobilizadas para combater o problema da escassez de água por meio do tratamento de águas poluídas, do controle de desperdícios, aproveitamento dos lençóis subterrâneos profundos, dessalinização da água do mar e da redução da evaporação. Não incluo nesta relação a produção de chuvas artificiais porque elas podem prejudicar outras regiões naturalmente beneficiadas, nem a sugestão de Tournier para a utilização das geladas calotas polares. Como a água é indispensável, têm sido aplicados vultosos recursos para deslocá-la das regiões beneficiadas para outras carentes, com o emprego de tubulações de grandes diâmetros e extensões. Na Califórnia, existe um aqueduto com 724 km de extensão e 5,33 m de diâmetro. Na Líbia, o coronel Muammar Kadafi construiu uma adutora, por ele denominada “O Grande Rio Construído pelo Homem”. Com uma tubulação subterrânea de 1.900 km de comprimento e 4 m de diâmetro, ela transporta para o populoso litoral do país a água que é captada ao longo de 234 poços perfurados no deserto do Saara. A primeira etapa do sistema de suprimento levou 10 anos para ser implantada, ao custo de US$ 4 bilhões. O sistema integral foi orçado em US$ 32 bilhões. Portugal ainda conserva, carinhosamente, a grandiosidade e a beleza de seus antigos aquedutos, alguns por mim visitados, como os de Lisboa, Tomar e Évora. Seus governantes estão atentos para as necessidades de água do país, tanto presentes como futuras.
Iceberg
Há alguns anos, um escritório francês de engenharia, associado ao explorador Paul Emile Victor, que durante 15 anos viveu na Antártica, concebeu um plano visando o deslocamento, ao longo de 8.000 km, de um iceberg daquele continente para suprir de água potável áreas desérticas da Arábia Saudita. O imenso bloco de gelo, com aproximadamente 1.500 m de comprimento, 800 m de largura e 700 m de altura, pesando 100 milhões de toneladas (das quais 80% a 90% submersas), seria devidamente envolvido por um lençol plástico, para reduzir-lhe as perdas por degelo durante a viagem, feita com o emprego de cinco possantes rebocadores. No iceberg, 30 estacas cilíndricas seriam cravadas na vertical, formando cinco conjuntos distribuídos estrategicamente. As seis estacas de cada conjunto, dispostas como os vértices de um hexágono regular, seriam contornadas em sua parte superior por um cabo a ser tracionado pelos rebocadores. Para a cravação, cada estaca metálica seria aquecida, a fim de derreter o gelo à medida que fosse descendo. Atingida a profundidade desejada, e cessado o aquecimento, a água que fosse derretida voltaria a solidificar-se, aderindo firmemente à superfície das estacas para garantir-lhes a indispensável estabilidade. Os rebocadores, com velocidade média de 2 km por hora, levariam seis meses para vencer o trajeto meticulosamente estudado, com sérios problemas a vencer, inclusive tempestades oceânicas e o ar quente do Equador, sendo o pior deles a entrada no mar Vermelho, com apenas 36 m de largura. Para poder transpô-la, após atravessar o Oceano Índico, fugindo aqui e ali das correntes marítimas, o iceberg teria de ser cortado em fatias verticais, através de um fio eletricamente aquecido. Durante o corte, o fio seria suspenso, de um extremo a outro, até ser atingido o topo do bloco – um lençol plástico destinado a evitar que as fatias viessem a se unir novamente. As porções do iceberg acabariam alcançando o lado oposto do Porto de Jidda, perto de Meca, onde depois de ancoradas, lado a lado, seriam aos poucos derretidas pelo sol. Então a água resultante sofreria um bombeamento para a terra, em direção aos pontos de consumo. O empreendimento, de custo exorbitante, foi concebido porque o preço da água potável seria bem menor que o resultante da dessalinização da água do mar. Mesmo que ao longo da viagem fossem perdidos 20% do volume do iceberg, conforme a previsão, o plano seria efetivado não como uma simples aventura de quem poderia custeá-la: o rei Khaled. Essa solução não chega a ser uma novidade, a não ser por suas dimensões. Há mais de um século, pequenos icebergs foram rebocados da laguna San Rafael, no sul do Chile, até o porto peruano de Callao, para ser utilizado como gelo na indústria. No final do século 19, a cidade de Valparaíso, também no Chile, utilizou-se desses icebergs para seu abastecimento de água.
Outros benefícios
Além de ser essencial aos organismos vivos, a água tem outras diversas funções em nosso mundo: produz energia elétrica, irriga os campos, facilita as comunicações por via marítima, fluvial e lacustre e participa como matéria-prima ou de processamento nas atividades industriais. No entanto, essa mesma água é capaz de desencadear guerras, transmitir doenças e provocar mortes. As epidemias, as inundações, os maremotos e outros calamitosos eventos por ela causados têm sido incontáveis no decorrer do tempo. Por tudo isso, a água merece o maior respeito por parte da humanidade.(Fonte: Site Brasil Rotário)