segunda-feira, 30 de julho de 2007

Para umentar os donativos para obras de caridade

Para aumentar o volume de donativos para obras de caridade, apele para o coração, e não para a mente
Fonte: http://www.wharton.universia.net/.

Vamos fazer um teste muito popular. Leia os dois parágrafos a seguir e depois escolha aquele que toca mais de perto seu coração:

A) Todo dinheiro que você doar irá para Rokia, uma menina de sete anos de Mali, na África. Rokia é extremamente pobre e vive constantemente ameaçada pela fome, podendo até morrer por causa dela. A vida de Rokia mudará para melhor se você fizer um donativo. Com sua ajuda, e a ajuda de outros benfeitores igualmente solícitos, a organização Salve as Crianças trabalhará com a família de Rokia e com outros membros de sua comunidade que ajudarão a alimentá-la e a educá-la, além de proporcionar a ela cuidados médicos básicos.

B) A escassez de alimentos no Malauí afeta mais de três milhões de crianças. Na Zâmbia, a ausência prolongada de chuvas resultou em uma queda de 42% na produção de milho de 2000 até hoje. Conseqüentemente, cerca de três milhões de zambianos estão ameaçados pela fome. Quatro milhões de angolanos — um terço da população — se viram obrigados a deixar suas casas. Mais de 11 milhões de etíopes necessitam de assistência alimentar imediata.

Se você escolheu a opção A, sua escolha coincidiu com a da maior parte das pessoas que fizeram o teste, de acordo com um novo estudo de Deborah Small
, professora de Marketing da Wharton, em parceria com dois outros colegas. Os pesquisadores descobriram que se as organizações quiserem levantar capital para uma obra de caridade, é muito melhor apelar ao coração do que à mente. Em outras palavras, os sentimentos, e não o pensamento analítico, é que motivam as doações.

Rokia é o que os pesquisadores acadêmicos chamam de “vítima conhecida”. Como tal, sua história pessoal, que enfatiza exclusivamente sua situação, e não a de outras vítimas da fome, tem muito mais chance de angariar doações do que descrições mais frias de “vítimas estatísticas” sem nome, como as do parágrafo B, informa Small.

O fato de as pessoas preferirem contribuir para vítimas conhecidas, como Rokia, a contribuir para vítimas da fome cujo nome desconhecem não é de forma alguma surpreendente. Contudo, Small e seus colegas realizaram uma série de experiências de campo e analisaram em profundidade a questão da solidariedade e de que modo ela se relaciona à contribuição para obras assistenciais. Os pesquisadores descobriram que se as pessoas tiverem informações sobre o caso concreto de uma vítima conhecida, além de dados estatísticos sobre vítimas em situação semelhante de doença, fome ou abandono, as doações, de modo geral, tendem a diminuir. Além disso, constataram que se as pessoas forem informadas sobre os níveis de discrepância de solidariedade suscitados pelas vítimas conhecidas e pelas vítimas das estatísticas — uma situação que caracteriza o “efeito da vítima conhecida”, de acordo com os pesquisadores —, as pessoas diminuem sua doação para as vítimas conhecidas, mas não aumentam a contribuição para as vítimas das estatísticas.

Small observa que as descobertas — com implicações para os gestores de políticas, órgãos ou pessoas encarregadas de levantar fundos para obras de caridade e até mesmo agências de notícias que pedem doações para as vítimas de tragédias — mostram que a solidariedade e as doações feitas quase nunca seguem um padrão racional.

“Quando fazem doações para causas assistenciais, as pessoas não avaliam de forma coerente as vidas em jogo”, observam Small e os demais autores, George Loewenstein, da Universidade Carnegie Mellon, e Paul Slovic, da Decision Research, uma empresa de pesquisas sem fins lucrativos de Eugene, no Oregon. “O dinheiro se concentra, com freqüência, em uma única vítima, embora um número maior de pessoas pudesse ser ajudado se os recursos fossem distribuídos ou gastos na proteção de vítimas futuras.”

Em muitos casos, a sociedade “estaria em situação bem melhor se os recursos fossem aplicados onde seu efeito resultasse no maior bem possível”, diz um estudo intitulado “Solidariedade e insensibilidade: o impacto do pensamento refletido sobre as doações a vítimas conhecidas e vítimas de dados estatísticos
.” Contudo, ao decidir doar dinheiro para uma causa, “a maior parte das pessoas provavelmente não calcula o benefício que resultará de sua doação. Pelo contrário, as escolhas são feitas intuitivamente, com base em reações afetivas espontâneas”.

O estudo cita diversos exemplos bem conhecidos de grandes somas doadas para auxiliar vítimas conhecidas. Em 1987, uma criança chamada Jessica McClure, apelidada de “Baby Jessica” pelos meios de comunicação, caiu em um poço perto de sua casa, no Texas, e recebeu cerca de 700.000 dólares em donativos do público. Ali Abbas, um garoto que perdeu os braços e os pais na Guerra do Iraque, em 2003, ganhou a atenção generalizada da mídia na Europa e recebeu cerca de 550.000 dólares em donativos. Até mesmo animais geram um clima de solidariedade: em 2002, mais de 48.000 dólares foram doados para o resgate de Forgea, um cão abandonado a bordo de um navio à deriva no Oceano Pacífico.

Porcentagens x valores absolutos
Por que as vítimas conhecidas despertam tantas emoções — e geram tantos dólares em doações? De modo geral, a pesquisa psicológica constatou que “as pessoas prestam mais atenção e têm reações emocionais mais fortes diante de informações mais vívidas do que outras menos expressivas”, observa Small, formada em psicologia. Além disso, a mente responde às porcentagens, e não a valores absolutos. “É por isso que engolimos em seco quando vemos liquidações de até 50%, pouco importa se o preço original era 5 ou 500 dólares”, acrescenta. De igual modo, salvar dez vidas em um grupo de 100 é um percentual elevado e, por isso mesmo, suscita uma resposta emocional mais contundente do que salvar dez vidas em um milhão. Uma vitima conhecida configura então um caso extremo. No momento em que a vítima é identificada, ela se torna seu próprio referencial — havia apenas uma Baby Jessica a salvar — e por isso o nível de solidariedade nesse caso foi maior.”

Small e os demais autores chegaram às suas conclusões depois de fazer uma série de quatro experiências de campo com a participação de cidadãos comuns. Os pesquisadores deram a cada pessoa cinco dólares em notas de um dólar. Em seguida, pediram a elas que lessem uma carta em que havia um pedido de ajuda financeira para uma obra assistencial que ia de zero a cinco dólares. A contribuição seria colocada anonimamente em um envelope.

As experiências tinham como objetivo incentivar o pensamento “racional” no momento em que as pessoas decidissem quanto doariam para as vítimas conhecidas e desconhecidas — isto é, vítimas de levantamentos estatísticos. Em uma das experiências, por exemplo, as pessoas eram informadas sobre o efeito da vítima conhecida antes de fazer o donativo. Em outra, os pesquisadores forneciam estatísticas sobre as vítimas juntamente com um pedido de doação para uma vítima conhecida.

A conclusão das quatro experiências foi que as pessoas demonstravam uma generosidade maior quando eram convidadas a fazer uma doação para uma vítima conhecida na ausência de um pensamento analítico “racional”. Quanto mais informações estatísticas as pessoas recebiam sobre a situação geral de um grupo de indivíduos, menos generosas elas se mostravam. Contudo, o pensamento baseado na emoção não foi capaz de incrementar o nível de generosidade das vítimas de estatísticas. “É fácil suplantar os sentimentos das pessoas dando a elas informações estatísticas”, assinala Small. “Mas não é tão fácil agregar sentimentos onde eles não se encontravam anteriormente. Os seres humanos sentem dificuldade de se emocionar diante de estatísticas.”

Uma descoberta positiva e sutil foi a de que os cidadãos comuns, ao serem informados sobre o efeito da vítima conhecida, pelo menos se mostravam mais coerentes em relação aos dois tipos de vítimas. No entanto, as experiências de campo mostraram que fornecer informações estatísticas às pessoas tinha um efeito nocivo sobre a solidariedade de modo geral, uma vez que as pessoas davam menos para as vítimas conhecidas, mas não aumentavam sua contribuição para as vítimas das estatísticas.

“O conhecimento da situação, nesse caso, parece gerar a insensibilidade”, observam os pesquisadores. “Sob alguns aspectos, essa conclusão parece bem fundamentada. Diante de um quase desastre de qualquer magnitude, é quase sempre possível pensar em coisas piores que já aconteceram ou que estejam acontecendo atualmente no mundo. As mortes (2.973) do 11 de setembro, por exemplo, comparadas com o massacre em Ruanda (estimado em cerca de 500 mil a um milhão de pessoas)”, parecem ter menos impacto. Todavia, o massacre de Ruanda “torna-se menos gritante em face do problema da aids na África. Raciocinar analiticamente sobre os problemas pode sufocar a solidariedade diante de desastres em escala menor sem com isso, observam os pesquisadores, resultar em mais preocupação com os desastres em larga escala”.

Os pesquisadores, porém, reconhecem que essa interpretação tem suas limitações. É possível, dizem, que o raciocínio refletido e racional, em alguns casos, conduza a um número maior de atitudes positivas em relação às obras de caridade. “Em oposição à diferença entre vítimas conhecidas e vítimas estatísticas”, dizem, “observamos com freqüência pouca solidariedade não refletida pelas vítimas necessitadas de outros países, ou de raças diferentes, ou de status socioeconômico diferente. Entretanto, se refletirmos sobre sua situação, é provável que reconheçamos sua necessidade. Em tais casos, supomos, as intervenções que incentivem o pensamento refletido como os apresentados nos quatro estudos [...] podem culminar em mais generosidade, em vez de menos”.

As obras de caridade necessitam de uma mensagem convincente
Que implicações o estudo de Small tem para as organizações de caridade? “É preciso elaborar uma mensagem simples e de conteúdo emocional convincente”, diz a pesquisadora. “A melhor maneira de fazê-lo é por meio de uma imagem ou de uma história, algo que toque diretamente as emoções. O erro que muitas entidades sociais cometem é o de tentar apelar tanto à emoção quanto à razão. Elas acreditam que esse procedimento seria mais eficaz do que apelar apenas para um ou outro, mas não é.”

Embora reconheçam que as doações poderiam ser distribuídas de forma mais eficiente entre as vítimas mais desesperadas se os doadores não tomassem decisões movidos tanto pelas emoções, os pesquisadores não criticam as pessoas que desejam ajudar quando movidas por um sentimento de solidariedade.

“Embora o dinheiro gasto com Baby Jessica e com Ali Abbas pudesse ter salvo mais vidas, teoricamente, se fosse mais igualmente distribuído, a ausência do efeito da vítima conhecida poderia ter reduzido drasticamente o ímpeto de doar”, observam. “Portanto, embora a existência de uma vítima conhecida possa distorcer um pouco a alocação da ajuda, seu impacto gera um volume maior de ajuda do que qualquer outro tipo de situação. As entidades de assistência social sabem disso, pelo menos implicitamente, quando recorrem a um pôster com a imagem de uma criança sem sempre que querem angariar doações para uma causa qualquer.”

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